Seguindo
com o nobre caminho óctuplo o segundo elemento é o pensamento correto, samma
sankappo, também às vezes traduzido como reta compreensão. Em qualquer sentido
se refere à postura correta, coerente com o dhamma, no modo de pensar, ou de
encarar ou de compreender os fenômenos, a saber, cultivando o pensamento de
generosidade, amorosidade e compaixão.
Na
definição apresentada pela tradução do SN XLV.8 aparece esse pensamento em sua
forma negativa, isto é, pensamento de renúncia, de não-crueldade e de
não-má-vontade. O que é o pensamento de renúncia no budismo? Ao que o budista renuncia
em sua forma de pensar? Nesse caso ele renuncia o que for oposto da
generosidade, ele renuncia à cobiça, ele não alimenta pensamentos cobiçosos e
sim os abandona.
Entenda-se
por cobiça muito amplamente abrangendo inveja, ânsia, desejo ardente, ambição,
ganância, mesquinhez, avareza, enfim, ele renuncia a um dos principais grilhões
que o mantem prisioneiro ao sofrimento e às visões errôneas, ao lado da aversão
e da ignorância. Cobiça nesse caso é o significado da palavra lobha, traduzida
geralmente como cobiça ou paixão, mas seu significado mais exato seria uma sede
ou ânsia insaciável, sem fim; é sinônimo de tanha, que literalmente significa
sede.
Ainda
sobre renúncia se costuma dizer também que o budista renuncia as ações
prejudiciais do corpo da fala e da mente, mas isso convém mais a outro tópico
mais a frente, em outro elemento do caminho óctuplo.
O pensamento correto se refere
ainda a estar livre da má vontade, cultivando a boa vontade que pode ser
desenvolvida através da amorosidade, da alegria altruísta e da equanimidade,
que são três dos quatro brahmaviharas (moradas divinas) que são
antídotos adequados para a hostilidade dos outros e para as tendências à raiva,
ódio, irritação, aversão na própria mente.
As quatro moradas
divinas são as supracitadas amorosidade (metta),
que é o desejo de bem estar e felicidade para com o outro; compaixão (karuna), que é o desejo de livrar o
outro do sofrimento; alegria altruísta (mudita),
que é regozijo com as virtudes, alegrias e êxitos do outro; e equanimidade (upekkha), a atitude de imparcialidade
desapegada com relação aos seres (não é apatia ou indiferença, mas uma atitude
que alé de conter as anteriores é justa). A compaixão é o próximo elemento a que
compõe o pensamento correto, é o pensamento que afasta a crueldade, é o
pensamento de não crueldade. Podemos considerar a compaixão como um antidoto ao
pensamento da incorreto da crueldade.
Além disso
as quatro moradas divinas fazer parte do conjunto dos dez parami (também paramita) que são as dez perfeição de caráter. Um grupo de
qualidades desenvolvidas, a saber, generosidade (dana), virtude (sila), renúncia
(nekkhamma), sabedoria (pañña), energia (viriya), paciência (khanti), honestidade (sacca), determinação (adhitthana), amor bondade (metta), e equanimidade (upekkha). Essa discussão convem mais a
outro tópico mais adiante.
Os pensamentos opostos do pensamento correto, se prestarmos atenção,
ocupam boa parte de nossos pensamentos no dia a dia, nos tiram a atenção, tiram
nossa energia, nossa alegira e nos estressam, obstruindo nossa visão e nossas
capacidades. O pensamento correto, quando bem aplicado,é o remédio que vai
corrigindo gradativamente todos esses problemasenos conduzindo gradualmente aos
próximos elementos do nobre caminho óctuplo, fala correta e ação correta.
Quando cada vez mais podemos ver que a palavra “correta” tem também o
significado de precisa.
Pensamento
Correto
Samma
Sankappo
Pensamento Correto é o segundo
dos oito elementos que compõem o Nobre
Caminho Óctuplo e pertence ao grupo da sabedoria
Definição
"E o que é pensamento correto? O
pensamento [1] da renúncia, [2] de estar livre da má vontade e [3] de estar
livre da crueldade. A isto se chama pensamento correto."
Cultivando pensamentos hábeis
" E como alguém se torna puro de três
formas pela ação mental? [1] É o caso em que alguém não é cobiçoso. Ele não
cobiça as posses dos outros, pensando, 'Ah, que aquilo que pertence aos outros
seja meu!' [2] A sua mente não possui má vontade e as suas intenções estão
isentas de raiva: 'Que esses seres possam estar livres da inimizade, aflição e
ansiedade! Que eles vivam felizes!’ [3] Ele tem entendimento
correto e não vê as coisas de forma distorcida: ‘Existe
aquilo que é dado e o que é oferecido e o que é sacrificado; existe fruto e
resultado de boas e más
ações; existe este mundo e o outro mundo; existe a mãe e
o pai; existem seres que renascem espontaneamente; existem no mundo brâmanes e
contemplativos bons e virtuosos que, após terem conhecido e compreendido
diretamente por eles mesmos, proclamam este mundo e o próximo.’
A sua relação com os outros
elementos do caminho
" E como é que o entendimento correto vem primeiro? A pessoa compreende pensamento incorreto como pensamento
incorreto e pensamento correto como pensamento correto. E o que é pensamento
incorreto? [1] O pensamento de sensualidade, [2] o pensamento de má
vontade, [3] o pensamento de crueldade: isso é pensamento incorreto...
"A pessoa [1] faz o esforço para abandonar o
pensamento incorreto e [2] penetrar no pensamento correto: Esse é o esforço correto da pessoa. A pessoa [1] com atenção plena abandona o
pensamento incorreto e [2] penetra e permanece no pensamento correto: Essa é a atenção
plena correta da pessoa. Dessa forma essas três qualidades - entendimento
correto, pensamento correto e atenção
plena correta – giram em torno do entendimento correto."
Dividindo o pensamento em duas
categorias
“Bhikkhus, antes da minha iluminação, quando eu
ainda era apenas um Bodisatva não iluminado, eu pensei: ‘E se eu dividisse os
meus pensamentos em duas categorias.’ Então coloquei de um lado os
pensamentos de desejo sensual, pensamentos de má vontade e pensamentos de
crueldade; e coloquei do outro lado os pensamentos de renúncia, pensamentos de
não má vontade e pensamentos de não crueldade.
“Enquanto assim permanecia, diligente, ardente e
decidido, um pensamento de desejo sensual surgiu em mim. Eu compreendi desta
forma: ‘Este pensamento de desejo sensual surgiu em mim. Isso conduz à minha
própria aflição, à aflição dos outros e à aflição de ambos; isso obstrui a
sabedoria, causa dificuldades, e afasta de Nibbana.’ Ao
pensar: ‘Isto conduz à minha própria aflição,’ aquilo arrefeceu em mim; ao
pensar: ‘Isto conduz à aflição dos outros,’ aquilo arrefeceu em mim; ao pensar:
‘Isto conduz à aflição de ambos,’ aquilo arrefeceu em mim; ao pensar: ‘Isso
obstrui a visão, causa dificuldades, e afasta de Nibbana,’ aquilo arrefeceu em
mim. Sempre que um desejo sensual surgia em mim, eu o abandonava, o removia, o
eliminava.
“Enquanto assim permanecia, diligente, ardente e
decidido, um pensamento de má vontade surgiu em mim…um pensamento de
crueldade surgiu em mim. Eu compreendi desta forma: ‘Este pensamento de
crueldade surgiu em mim. Isso conduz à minha própria aflição, à aflição dos
outros e à aflição de ambos; isso obstrui a sabedoria, causa dificuldades, e
afasta de Nibbana.’ Ao pensar: ‘Isto conduz à minha própria aflição,’ aquilo
arrefeceu em mim; ao pensar: ‘Isto conduz à aflição dos outros,’ aquilo
arrefeceu em mim; ao pensar: ‘Isto conduz à aflição de ambos,’ aquilo arrefeceu
em mim; ao pensar: ‘Isso obstrui a visão, causa dificuldades, e afasta de
Nibbana,’ aquilo arrefeceu em mim. Sempre que um pensamento de crueldade surgia
em mim, eu o abandonava, o removia, o eliminava.
“Bhikkhus, qualquer coisa na qual um bhikkhu
pense e pondere com freqüência, essa passará a ser a tendência da sua mente.
Se ele pensar e ponderar com frequência pensamentos de desejo sensual, ele terá
abandonado o pensamento da renúncia para cultivar o pensamento do desejo
sensual, e então a sua mente irá tender para os pensamentos desejo sensual. Se
ele pensar e ponderar com frequência pensamentos de má vontade…pensamentos de
crueldade, ele terá abandonado o pensamento da não crueldade para cultivar o
pensamento da crueldade, e então a sua mente irá tender para os pensamentos de
crueldade.
Refletindo sobre as ações que
praticamos
“Rahula, [I] quando você [1] quiser praticar uma
ação com o corpo, você deveria refletir a respeito: [a] 'Esta ação corporal que
quero praticar - conduzirá à minha própria aflição, à aflição de outros, ou
ambos? [b] É uma ação corporal sem habilidade, com consequências dolorosas,
resultados dolorosos?' Se, refletindo, você sabe que conduzirá à sua própria
aflição, à aflição de outros, ou ambos; será uma ação sem habilidade com consequências
dolorosas, resultados dolorosos, então qualquer ação corporal desse tipo é
totalmente inadequada. Porém se refletindo, você sabe que [c] não causará a própria
aflição, a de outros, ou de ambos, e que [d] será uma ação habilidosa com
felizes consequências, felizes resultados, então qualquer ação corporal desse
tipo é adequada.
"Também, Rahula, [2] enquanto você estiver
praticando uma ação com o corpo, você deveria refletir a seu respeito:
'Esta ação corporal que estou praticando - conduzirá à minha própria aflição, à
aflição de outros, ou ambos? É uma ação corporal sem habilidade, com consequências
dolorosas, resultados dolorosos?' Se, refletindo, você sabe que conduzirá à sua
própria aflição, à aflição de outros, ou ambos...você deveria desistir dela.
Porém se refletindo você sabe que não é...você pode continuar com a ação
corporal.
“Também, Rahula, [3] tendo praticado uma ação
corporal, você deveria refletir a respeito ... se, refletindo, você sabe
que conduziu à sua própria aflição, à aflição de outros, ou ambos; foi uma ação
sem habilidade com consequências dolorosas, resultados dolorosos, então você
deveria confessá-la, revelá-la, abri-la para o Mestre ou um sábio companheiro
na vida santa. Tendo confessado...você deve exercer contenção no futuro.Porém
se refletindo você sabe que não conduziu à aflição...foi um ação corporal
habilidosa com conseqüências felizes, resultados felizes, então você deveria
se sentir mentalmente renovado e contente, treinando dia e noite nos estados
benéficos.
...[da mesma forma para ações [II] verbais e [III]
mentais]...
" Portanto, Rahula, você deve treinar dessa
forma: 'Eu purificarei minhas [I] ações corporais, [II] ações verbais e [III]
ações mentais através da repetida reflexão."
Amor bondade
"Aqui, bhikkhus, uma certa pessoa permanece
com o coração [a] pleno de amor bondade permeando o primeiro quadrante com a
mente imbuída de amor bondade, da mesma forma o segundo, da mesma forma o
terceiro, da mesma forma o quarto; assim acima, abaixo, em volta e em todos os
lugares, para todos bem como para si mesma, ela permanece permeando o mundo
todo com a mente imbuída de amor bondade, abundante, transcendente,
imensurável, [b] sem hostilidade e [c] sem má vontade."
Para si mesmo, para os outros
“De duas pessoas que praticam o Dhamma de acordo
com o Dhamma, tendo noção do Dhamma, tendo noção do significado – uma pratica
tanto para o seu benefício como o benefício dos outros, e outra pratica para o
seu próprio benefício porém não para o benefício dos outros - aquela que
pratica para o seu próprio benefício porém não para o benefício dos outros deve
ser criticada por isso, aquela que pratica tanto para o seu benefício como para
o benefício dos outros deve ser elogiada por isso.”