quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

'VIRTUDES E BEM-ESTAR'


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          Finalizando os preparativos para receber Sua Santidade o Dalai Lama para um diálogo sobre Saúde Global e Bem-Estar, evento co-patrocinado pelo Center for Investigating Healthy Minds e pelo Global Health Institute, ambos da Universidade de Wisconsin – Madison, é oportuno refletir sobre o que a ciência está nos ensinando sobre bem-estar. Há quatro coisas que podemos agora dizer que a ciência nos ensinou sobre bem-estar:

1. O bem-estar é uma habilidade. Ao conceituar o bem-estar como uma habilidade, lançamos mão das idéias modernas da neurociência, em que o estudo da neuroplasticidade nos informa que a mente e o cérebro são altamente mutáveis, e que o cérebro está constantemente sendo moldado pela experiência e treinamento. Visto dessa perspectiva, o bem-estar é o produto de habilidades que podem ser melhoradas através de treinamento e que também está sujeito a influências ambientais que afetam o nosso cérebro, especialmente ao longo do desenvolvimento.

2. O bem-estar está associado a padrões específicos de atividade cerebral que influenciam e são influenciados pelo corpo. Descobertas recentes estabelecem que padrões específicos de atividade cerebral envolvendo o córtex pré-frontal e regiões límbicas (abaixo do córtex) estão associados com relatos de bem-estar. Os circuitos no cérebro que sabemos estar correlacionados com o bem-estar desempenham um papel na regulação das funções corporais – imunológica, endócrina e a atividade do sistema nervoso autônomo – e, por meio dessas influências, podem afetar a saúde física e a doença. Por sua vez, a atividade nestes sistemas corporais podem retroagir sobre o cérebro e modular sua atividade. Através desta comunicação bidirecional entre o cérebro e o corpo, foram identificadas algumas vias, que nos permite começar a entender porque nossa saúde física e emocional estão intimamente interligadas. Não é por acaso que as pessoas mais felizes são mais saudáveis. Estudos neurocientíficos modernos estão lançando luz sobre os mecanismos pelos quais essas associações podem surgir.

3. Equanimidade e generosidade contribuem para o bem-estar e estão associadas a padrões distintos de atividade cerebral e corporal. O Dalai Lama tem frequentemente nos pedido para sermos gentis para com os outros e sugeriu que a bondade é um caminho direto para a felicidade. A pesquisa moderna apóia e indica que a bondade e a compaixão para com os outros estão associadas com mudanças biológicas periféricas (ie, abaixo do pescoço) que são saudáveis. A equanimidade pode ser cultivada por meio de práticas contemplativas simples e está associada a estar atento ao momento presente, e a não se perder em preocupações com o futuro e ruminações sobre o passado. Uma pesquisa recente indica que o americano adulto médio gasta cerca de 50% de vida em vigília com sua mente vagando – não prestando atenção ao que está realmente fazendo. Aprendendo a nos manter conscientes do momento presente, podemos deixar de ser escravos do passado e do futuro. Isso por si só pode poderosamente facilitar o bem-estar e reduzir o sofrimento.

Foram conduzidos experimentos nos quais os participantes foram divididos em dois grupos – no primeiro grupo, eles receberam dinheiro e foram orientados a sair e gastar o dinheiro em compras coisas apenas para si; no segundo grupo , eles receberam a mesma quantidade de dinheiro que o primeiro grupo, mas foram instruídos a gastar o dinheiro só com os outros. Os participantes deste último grupo foram explicitamente proibidos de gastar qualquer do dinheiro consigo mesmos. Foram instruídos a comprar presentes apenas para os outros. Antes de serem aleatoriamente designados para um dos dois grupos, receberam questionários simples, pedindo-lhes para avaliar os seus níveis gerais de felicidade e bem-estar. Depois de gastar dinheiro consigo mesmos ou com os outros por um dia, eles voltaram para o laboratório e receberam os questionários novamente, pedindo-lhes para avaliar o seu nível geral de bem-estar. Já que eu estou escrevendo sobre isso, tenho certeza que você pode adivinhar qual grupo mostrou maior aumento de felicidade ao longo do dia – é claro, foi o grupo instruído a gastar o dinheiro só com os outros.

Outra coisa surpreendente sobre generosidade e bondade é que um crescente corpo de evidências sugere que tal comportamento é positivo para as nossas funções biológicas – ajuda a reduzir a inflamação e as moléculas responsáveis pelo aumento da inflamação.

4. Há uma disposição inata para o bem-estar e para o comportamento pro-social. Os organismos se orientam em direção a estímulos e situações que promovam o bem-estar. Nós preferimos as coisas que promovem o bem-estar e buscamos contextos em que o bem-estar possa florescer. Nós, muitas vezes, gastamos recursos para melhorar o bem-estar. Nós não buscamos nos tornar mais tristes ou com mais com raiva ou mais aversão. Isto é bastante universal e parece estar presente em todos os seres vivos. Além disso, pesquisas recentes indicam que os bebês humanos nos primeiros seis meses de vida mostram uma preferência por situações pró-sociais e cooperativas, em comparação com as agressivas e antagônicas. Se isso de fato continuar a ser replicado em uma ampla gama de culturas, nos convidaria à visão de que viemos ao mundo com uma preferência inata para o bem e que nós obscurecemos esta propensão inata ao longo do desenvolvimento, conforme nos tornamos socializados dentro de nossa cultura moderna. Quando nos envolvemos em práticas para desenvolver a compaixão, não estamos realmente aprendendo uma nova habilidade, mas sim desaprendendo aquilo que está interferindo na nossa capacidade de nos conectarmos com uma essência fundamental da bondade inata.

Na medida em que essas ideias se tornam mais amplamente conhecidas e apreciadas, é minha aspiração fervorosa que a nossa cultura preste mais atenção ao bem-estar, que inclui estratégias para promover o bem-estar nos nossos currículos educacionais e na área da saúde, e que inclua o bem-estar dentro de nossas definições de saúde. Essas mudanças ajudariam a promover uma maior harmonia e maior bem-estar do planeta.

Richard J. Davidson, PhD, é Professor de Psicologia e Psiquiatria, fundador e presidente do Centro de Investigação de Mentes Saudáveis no Waisman Center, da Universidade de Wisconsin-Madison.