quarta-feira, 27 de agosto de 2014

RELAXAR NAQUILO QUE OCORRE (RESUMO PRÁTICO)


            Quando estamos iniciando ou quando estamos num dia difícil de meditar esse tipo de meditação ajuda muito. O ideal é praticarmos todos os dias num horário determinado, se estamos determinados a treinar e progredir em nossa prática podemos ter dois ou três horários por dia ou se não for possível um horário determinado manter num horário mais flexível uma, duas ou três sessões de meditação por dia é um excelente começo.

            No início os períodos podem ser curtos, podendo ser de até 5 minutos. Porém o melhor é começar com dois ou três períodos diários de 10 ou 15 minutos. Existe uma pesquisa que mostra que o progresso na prática e o conforto chegam mais rápido quando se começa assim e vai gradativamente aos poucos aumentando o tempo, como um minuto por dia ou cinco por semana.

            É bom também que em um desses períodos o tempo seja maior, tentar 20 ou 30 minutos por exemplo. Se isso não for possível só, com um grupo de meditadores ou num centro budista ou com um amigo com certeza será mais reforçador. Aqueles que já têm prática podem também tentar num horário chegar a 45 minutos ou mesmo uma hora, pelo menos uma vez por semana. Nesse resumo temos uma dica sobre a postura e um maior conforto. Acrescento apenas que para os ocidentais pode ser difícil deixar a coluna reta numa superfície plana e como a coluna ereta é um aspecto importante da meditação sentada podemos adotar uma almofada que fique alta com cerca de 10 ou 20 cm depois que sentamos nela com os pés no chão. E uma leve inclinação para frente ajuda a equilibrar a posição.

 

 

Meditação segundo Chögyam Trungpa Rinpoche

 

1.apenas abrir a mente e relaxar. Quando distraídos pelos pensamentos, simplesmente deixar que eles se dissolvessem e voltar para o estado mental aberto e relaxado.

 

2. voltar muito levemente sua atenção para a expiração, à simples expiração normal, sem qualquer manipulação, a atenção suave, com um toque de leveza, cerca de 25% da atenção voltada para a respiração, de modo que ainda [seja] possível ter consciência do ambiente, sem considerá-lo como uma interferência ou obstáculo à meditação.  relaxar mais integralmente em nosso ambiente, apreciar o mundo mais integralmente em nosso ambiente, apreciar o mundo que nos cerca e a verdade simples que acontece a todos os momentos.

a expiração — impalpável e fluida, sempre em mutação, que não pode ser agarrada e que, mesmo assim, ocorre continuamente - é objeto da meditação . Quando inspiramos, é como se estivéssemos em uma pausa ou hiato. Não há nada especial a fazer, a não ser esperar pela próxima expiração.

estar aberto e relaxar, sem adicionar nada nem conceituar, voltando sempre à mente tal como ela simplesmente é — clara, lúcida e fresca.

 

3. colocar em nossos pensamentos o rótulo "pensando". dizer a nós mesmos "pensando" e, sem fazer disso algo muito importante, simplesmente voltar à expiração. Os pensamentos cruzam nossa mente o tempo todo e, quando sentamos, estamos dando a todos eles muito espaço para que surjam. Como nuvens em um céu amplo ou ondas em um vasto mar, estamos dando a todos os nossos pensamentos espaço para que apareçam. Quando um deles atrai nossa atenção e nos arrebata, quer seja agradável ou desagradável, devemos rotulá-lo "pensando", com toda a abertura e bondade que pudermos reunir, e deixar que ele se dissolva no amplo céu. Não há problema se as nuvens e ondas imediatamente retornam. Simplesmente reconhecemos sua existência mais uma vez, com amizade incondicional, rotulamos "pensando" e deixamos que elas se dissolvam continuamente. surge uma surpresa bem desagradável. Tudo bem. Quem seja assim. Não devemos rejeitar esse aspecto, mas compassivamente reconhece-lo como "pensando" e deixar que ela vá. Então — opa! — aparece uma surpresa muito agradável. Tudo bem. Que seja assim. Mais uma vez, não devemos nos apegar a esse aspecto, mas compassivamente reconhece-lo como "pensando" e deixar que ele vá.

o objetivo não é tentar livrar-se dos pensamentos, mas ver sua verdadeira natureza. Ficaremos dando voltas inúteis com nossos pensamentos se acreditarmos em sua solidez. Na verdade, eles são como imagens de sonho. São como uma ilusão — não são tão sólidos assim. são apenas pensamentos.


4. sobre postura, aplicar esforço durante a meditação nunca é uma boa idéia. não há problema em nos movimentarmos quando sentimos dores nas pernas ou nas costas. Entretanto, trabalhando com a postura correta, é possível estar bem mais relaxado e acomodado no próprio corpo por meio de ajustes muito sutis. Os movimentos amplos trazem conforto por cerca de cinco ou dez minutos e, em seguida, precisamos nos mover outra vez. os seis pontos da boa postura para conseguir realmente nos acomodar são:

  1. onde sentar: Quer você esteja sentado em uma almofada colocada no chão ou em uma cadeira, o assento deve ser plano, sem inclinação para a esquerda ou para a direita, para frente ou para trás.
  2. pernas: As pernas devem estar confortavelmente cruzadas à frente — ou, se estiver sentado em uma cadeira, os pés devem estar bem apoiados no chão e os joelhos afastados alguns centímetros.
  3. tronco: O tronco (da cabeça até o assento) deve estar ereto, com a parte posterior firme e a parte anterior aberta. Se estiver em uma cadeira, é melhor não se encostar Se você começar a encurvar, simplesmente sente ereto outra vez.
  4. mãos: As mãos ficam abertas, com as palmas para baixo, repousadas sobre as coxas.
  5. olhos: Os olhos permanecem abertos, indicando uma atitude de estar desperto e relaxado em tudo que acontece. O olhar dirige-se ligeiramente para baixo, para um ponto localizado aproximadamente dois metros à frente.
  6. boca: A boca fica levemente entreaberta, de modo que o maxilar relaxe, permitindo que o ar circule livremente pela boca e pelo nariz. A ponta da língua pode estar apoiada no céu da boca.

 Sempre que sentamos para meditar, podemos percorrer esses seis pontos e, quando nos sentirmos distraídos durante a meditação, podemos trazer nossa atenção de volta para o corpo e repassá-los. Então, com a sensação de estar recomeçando, voltamos mais uma vez à expiração.

Encontramos um tempo todos os dias e sentamos em nossa própria companhia. Voltamos à respiração continuamente, atravessamos o tédio, a irritação, o medo e o bem-estar. Essa perseverança e repetição — quando contêm honestidade, leveza, humor e bondade — são a própria recompensa.

 

Extraído do texto Relaxe Naquilo que Ocorre

(Chödrön, Pema. Quando tudo se desfaz: instruções para tempos difíceis.
Traduzido por Helenice Gouvêa. Rio de Janeiro: Gryphus, 1999. Pág. 137-147. Para adquirir o livro, clique aqui.)

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

A DISCIPLINA BUDISTA PARA O DISCÍPULO NÃO ORDENADO


O que é ser um budista? O que faz da pessoa uma praticante? Como um budista que não é um monge pode galgar as etapas do caminho e atingir a iluminação? São perguntas que se costuma fazer e que merecem atenção e uma resposta condizente. O sutta abaixo é justamente o caso, uma resposta do Buda, sobre como deve se portar uma pessoa, não ordenada, coerentemente como o modo budista de ver e de viver para maximizar o avanço em direção à iluminação. Buda aborda o jovem Sigala que estava fazendo uma reverencia típica às seis direções e então aproveita uma prática de outra religião da época, feita sem compreensão, supersticiosamente ou apenas por herança ou tradição para traduzi-la em seu próprio ensinamento. E nisso ele sintetiza o modo de vida preconizado em seu ensinamento.

É um mito dizer que só monges podem atingir as metas mais elevadas do ensinamento. Os suttas mostram que Buda mesmo aceitou muitos discípulos não ordenados (chamados hoje de leigos pela maioria) e que alguns desses atingiram até a iluminação. Aqui muitas vezes Buda trata do “chefe de família” e evidentemente nem todos podem ser incluídos nessa condição, porém o modo deste se comportar é o modelo que todos devem atingir um dia, é o modelo de educação para a vida do indivíduo e para a construção de uma sociedade mais harmoniosa, feliz, honesta e amorosa.

Mas o mais importante é saber, respondendo as perguntas acima, o que fazer e como fazer, como praticar, como ser um praticante, um discípulo do Buda. Ou mesmo não sendo budista, como se beneficiar pelo estudo e prática dos ensinamentos do Buda, afinal, quando bem experimentados na prática já conduzem por si só a uma vida mais feliz, mais lúcida, mais equilibrada e relações mais harmoniosas consigo mesmo e sua própria mente, com os outros e com o ambiente em que vivemos. E às esses ensinamentos conduzem o ouvinte (ou leitor) a se tornarem budistas. O que é isso? Vamos ao sutta...

Digha Nikaya 31

Sigalovada Sutta

O Discurso para Sigala –

O Código de Disciplina para a Pessoa Leiga

Somente para distribuição gratuita



Assim ouvi. Em certa ocasião o Abençoado estava no Bambual, no Santuário dos Esquilos, próximo a Rajagaha. Agora naquela ocasião, o jovem Sigala, o filho de um chefe de família, tendo se levantado cedo pela manhã e partido de Rajagaha, estava com as roupas úmidas e o cabelo úmido, orando, com as mãos postas, para as várias direções – o Leste, o Sul, o Oeste, o Norte, o Nadir, e o Zênite.

 Então, ao amanhecer, o Abençoado se vestiu e tomando a tigela e o manto externo, foi para Rajagaha para esmolar alimentos. Ao ver o jovem Sigala orando daquela forma para as várias direções, ele disse:

-Por que razão você, jovem chefe de família, tendo se levantado cedo pela manhã e partido de Rajagaha, está com as roupas úmidas e o cabelo úmido, orando, com as mãos postas, para as várias direções – o Leste, o Sul, o Oeste, o Norte, o Nadir, e o Zênite?

-Meu pai, senhor, quando estava morrendo, me disse para fazer isso. E eu, senhor, respeitando, reverenciando e honrando a palavra do meu pai, levanto-me cedo pela manhã, parto de Rajagaha e oro, com as mãos postas, para essas seis direções.

-Mas, jovem chefe de família, essa não é a forma, que, de acordo com a disciplina dos nobres, as seis direções devem ser veneradas.

-Como então, senhor? Seria bom, senhor, se o Abençoado me ensinasse a maneira apropriada para venerar as seis direções de acordo com a disciplina dos nobres.

-Então, jovem chefe de família, ouça e preste muita atenção àquilo que eu vou dizer.” – “Sim, senhor,” ele respondeu. O Abençoado disse o seguinte: "Jovem chefe de família, (1) erradicando os quatro vícios de conduta, [1] (2) não cometendo nenhuma ação ruim e prejudicial com base em quatro causas, (3) não seguindo pelos seis caminhos para a dissipação da fortuna, é evitando essas catorze coisas ruins que um nobre discípulo cobre as seis direções, e através dessa prática conquista a vitória em ambos os mundos: ele é favorecido neste mundo e no mundo vindouro e com a dissolução do corpo, após a morte, ele irá para um destino feliz, no paraíso.

(1) "Quais são os quatro vícios de conduta que ele erradicou? 1. Destruir a vida, 2. tomar aquilo que não for dado, 3. conduta sexual ilícita e 4. linguagem mentirosa. Esses são os quatro vícios que ele erradicou." Assim falou o Abençoado. E tendo dito isso, o Mestre disse ainda mais:

‘Matar e roubar, mentir,
Adultério, o sábio reprova.

(2) "Quais são as quatro causas de ações ruins e prejudiciais que ele evita? As ações ruins e prejudiciais 1. têm origem no desejo, 2. têm origem na raiva, 3. têm origem da ignorância, 4. têm origem no temor.[2] Se o nobre discípulo não agir com base no desejo, raiva, ignorância e medo, ele não fará o mal com base em nenhuma das quatro causas." E tendo dito isso, o Mestre disse ainda mais:

‘Desejo e raiva, temor e ignorância:
Quem transgride o Dhamma com base nisso,
Perde toda reputação
Tal como a lua no quarto minguante.

Desejo e raiva, temor e ignorância:
Quem nunca cede a isso
Cresce em retidão e reputação
Tal como a lua no quarto crescente.

(3) "Quais são os seis caminhos para dissipação da fortuna que ele não segue?

(a) entregar-se a substâncias embriagantes que causam a paixão cega e a negligência;
(b) vaguear pelas ruas em horas inadequadas;
(c) freqüentar espetáculos públicos;
(d) entregar-se ao jogo;
(e) associar-se a más companhias;
(f) o hábito da indolência;

(a) "Existem esses seis perigos por entregar-se a substâncias embriagantes que causam a paixão cega e negligência:

(i) perda de fortuna,
(ii) aumento nas brigas,
(iii) suscetibilidade à doença,
(iv) ganhar uma má reputação,
(v) exposição desavergonhada do corpo,
(vi) enfraquecimento do intelecto.

             (b) "Existem esses seis perigos por vaguear pelas ruas em horas inadequadas:

(i) ele está desprotegido e desguardado,
(ii) sua mulher e filhos estão desprotegidos e desguardados,
(iii) seu patrimônio está desprotegido e desguardado,
(iv) ele é suspeito de crimes,[
3
]
(v) ele é vítima de rumores falsos,
(vi) ele enfrenta todo tipo de problemas.

(c) "Existem esses seis perigos por freqüentar espetáculos públicos:

"Ele sempre está pensando:

(i) onde está a dança?
(ii) onde estão cantando?
(iii) onde está a música?
(iv) onde está a recitação?
(v) onde estão os tambores?
(vi) onde estão batendo palmas? [
4]

 (d) "Existem esses seis perigos por entregar-se ao jogo:

(i) o ganhador cria inimigos
(ii) o perdedor se angustia pela fortuna perdida,
(iii) perda de patrimônio,
(iv) a sua palavra não é confiável numa assembléia,
(v) ele é desprezado por seus amigos e companheiros,
(vi) ele não é procurado para matrimonio; pois as pessoas dizem que ele é um jogador e não está em condições de cuidar de uma esposa.

(e) "Existem esses seis perigos por associar-se a más companhias, ou seja: qualquer jogador, qualquer libertino, qualquer bêbado, qualquer trapaceiro, qualquer vigarista, qualquer brigão é o seu amigo e companheiro.

(f) "Existem esses seis perigos por ter o vício da indolência:

"Ele não faz nenhum trabalho, dizendo:

(i) está extremamente frio,
(ii) está extremamente quente,
(iii) é muito tarde da noite,
(iv) é muito cedo pela manhã,
(v) que ele está extremamente faminto,
(vi) que ele está demasiadamente satisfeito.”

E tendo dito isso, o Mestre disse ainda mais:

"Alguns são companheiros na bebida, e alguns

Professam amizade apenas na sua frente,

Alguns são amigos apenas

Quando lhes convém.

 

Deitar-se tarde, adultério,

Irascibilidade, malevolência,

Amizades ruins e avareza,

Essas seis coisas destroem um homem.

 

Ele que tem amigos malvados

E se entrega às más ações,

Neste mundo e no próximo também

Esse homem irá sofrer.

 

Dados, mulheres, bebidas, dança,

Dormir durante o dia, vaguear em horas inadequadas,

Más companhias, avareza –

Essas nove [5] causam a ruína de um homem.

 

Quem joga com os dados e bebe embriagantes

Procura mulheres que são queridas por outros como as suas próprias vidas,

Associa-se com os malvados e não com os anciãos –

Ele declina tal como a lua durante o quarto minguante.

 

Quem é bêbado, pobre, destituído,

Ainda sedento enquanto bebe,

Freqüenta os bares, se afunda em dívidas como uma pedra na água,

Rapidamente traz má reputação para sua família.

 

Quem por hábito dorme durante o dia,

Fica desperto até altas horas da noite,

Está sempre embriagado, é licensioso,

Não está em condições para ter uma vida em família.

 

Quem diz está muito quente, muito frio, muito tarde,

E deixa as coisas por fazer,

As oportunidades para fazer o bem

Passam desapercebidas por tais homens.

 

Porém aquele que vê no frio ou no calor

Menos que num pedaço de capim,

E que faz o que deve ser feito,

Não irá perder a felicidade."

"Esses quatro, jovem chefe de família, devem ser entendidos como inimigos disfarçados de amigos:

(1) aquele que se apropria das posses de um amigo,
(2) aquele que faz falsos elogios,
(3) aquele que bajula,
(4) aquele que traz a ruína.

(1) "De quatro formas, aquele que se apropria das posses deve ser entendido como um inimigo disfarçado como um amigo:

(i) ele toma tudo,
(ii) ele dá pouco e pede muito,
(iii) ele faz as suas tarefas por medo,
(iv) ele se associa para proveito próprio.

(2) "De quatro formas, aquele que faz falsos elogios deve ser entendido como um inimigo disfarçado de um amigo:

(i) ele faz declarações amigáveis relativas ao passado,
(ii) ele faz declarações amigáveis relativas ao futuro,
(iii) ele tenta obter os favores de alguém através de palavras vazias,
(iv) quando a oportunidade para fazer um serviço surge, ele expressa a sua inabilidade.

(3) "De quatro formas, aquele que bajula deve ser entendido como um inimigo disfarçado de um amigo:

(i) ele aprova as más ações do seu amigo,
(ii) ele desaprova as boas ações do seu amigo,
(iii) ele o elogia apenas na sua presença,
(iv) ele fala mal na sua ausência.

(4) "De quatro formas, aquele que traz a ruína deve ser entendido como um inimigo disfarçado de um amigo:

(i) ele é um companheiro no entregar-se aos embriagantes que causam paixão cega e negligência,
(ii) ele é um companheiro em vaguear pelas ruas em horas inadequadas,
(iii) ele é um companheiro em freqüentar espetáculos públicos,
(iv) ele é um companheiro em entregar-se ao jogo.”

Assim falou o Abençoado. E tendo dito isso, o Mestre disse ainda mais:

"O amigo que se apropria,
O amigo que faz falsos elogios,
O amigo que bajula,
O amigo que traz a ruína,
Esses quatro o sábio observa como inimigos,
Evita-os à distância como caminhos do perigo.

"Esses quatro, jovem chefe de família, devem ser entendidos como amigos com bom coração:

(1) ele oferece ajuda,
(2) ele é o mesmo na alegria e na tristeza,
(3) ele dá bons conselhos,
(4) ele se compadece.

(1) "De quatro formas, aquele que oferece ajuda deve ser entendido como um amigo com bom coração:

(i) ele cuida do sem cuidado,
(ii) ele protege a fortuna do sem cuidado,
(iii) ele se torna um refúgio quando você está em perigo,
(iv) quando há compromissos ele lhe dá o dobro dos suprimentos necessários.

(2) "De quatro formas, aquele que é o mesmo na alegria e na tristeza deve ser entendido como um amigo com bom coração:

(i) ele revela os próprios segredos
(ii) ele guarda os segredos do outro,
(iii) no infortúnio ele não abandona o outro,
(iv) ele sacrifica a sua própria vida pelo bem do outro.

(3) "De quatro formas, aquele que dá bons conselhos deve ser entendido como um amigo com bom coração:

(i) ele o refreia de fazer o mal,
(ii) ele o encoraja a fazer o bem,
(iii) ele o informa acerca daquilo que ele não sabe,
(iv) ele aponta o caminho para o paraíso.

(4) "De quatro formas, aquele que se compadece deve ser entendido como um amigo com bom coração:

(i) ele não se alegra com o seu infortúnio,
(ii) ele se alegra com o seu sucesso,
(iii) ele não permite que outros falem mal a seu respeito,
(iv) ele elogia aqueles que falam coisas boas a seu respeito."

Assim falou o Abençoado. E tendo dito isso, o Mestre disse ainda mais:

"O amigo que oferece ajuda,
O amigo na alegria e na tristeza,
O amigo que dá bons conselhos,
O amigo que se compadece -
Esses quatro tipos de amigos o sábio
Deve neles reconhecer o seu verdadeiro valor

E guardá-los com cuidado no coração
Tal como uma mãe o seu próprio filho.

O nobre e virtuoso brilha como a chama de um fogo.
Ele que obtém sua fortuna sem prejudicar aos outros
Como uma abelha que coleta o mel, [
6
]
As riquezas para ele se acumulam
Como o rápido crescimento de um formigueiro.

Com a riqueza assim obtida o leigo pode
Dedicar-se ao bem dos seus,
Ele deve dividir a sua fortuna em quatro:
(Isso irá trazer mais benefícios).

Uma porção ele usa para as suas necessidades, [7]
duas porções ele gasta no seu negócio,
a quarta parte ele guarda para tempos dificeis.

"E como, jovem chefe de família, um nobre discípulo protege as seis direções? Essas seis coisas devem ser encaradas como as seis direções. A mãe e o pai devem ser encarados como o Leste, os mestres como o Sul, a mulher e filhos como o Oeste, os amigos e sócios como o Norte, os serviçais e empregados como o Nadir, os contemplativos e brâmanes como o Zênite.[8]

"De cinco formas um homem deve servir à sua mãe e ao seu pai como o Leste:

(i) Tendo me dado sustento eu lhes darei sustento
(ii) Eu farei as suas tarefas,
(iii) Eu manterei a tradição da família,
(iv) Eu me farei digno da minha herança,
(v) além disso eu farei oferendas em honra dos meus pais quando eles se forem
.[9]

"De cinco formas, a mãe e o pai sendo assim servidos como o Leste pelo seu filho, irão retribuir:

(i) eles o refreiam do mal,
(ii) eles o encorajam a fazer o bem,
(iii) eles o treinam em uma profissão,
(iv) eles arranjam um casamento adequado,
(v) no momento adequado eles lhe dão a sua herança.

“Dessa forma o Leste está coberto, fazendo com que esteja em paz e livre do temor.

"De cinco formas um pupilo deve servir ao seu mestre como o Sul:

(i) levantando-se do assento para saudá-lo,
(ii) acompanhando-o,
(iii) sendo atencioso,
(iv) servindo-o,
(v) obtendo proficiência naquilo que é ensinado.

"De cinco formas, o mestre sendo assim servido como o Sul pelo seu pupilo, irá retribuir:

(i) ele o treina com instruções completas,
(ii) ele faz com que aquilo que deve ser entendido, tenha sido entendido,
(iii) ele o instrui em todas artes e ciências,
(iv) ele o recomenda para os seus amigos e colegas,
(v) ele proporciona segurança de todas as formas.

“Dessa forma o Sul está coberto, fazendo com que esteja em paz e livre do temor.

"De cinco formas um esposo deve servir a esposa como o Oeste:

(i) honrando-a,
(ii) não depreciando-a,
(iii) sendo-lhe fiel,
(iv) dando-lhe autoridade,
(v) dando-lhe ornamentos.

"De cinco formas, a esposa sendo assim servida como o Oeste pelo seu esposo, irá retribuir:

(i) ela organiza o trabalho da forma adequada,
(ii) ela é gentil com os criados [
10
]
(iii) ela é fiel,
(iv) ela protege o que ele traz,
(v) ela é habilidosa e diligente em tudo que faz.

“Dessa forma o Oeste está coberto, fazendo com que esteja em paz e livre do temor.

"De cinco formas um membro de um clã deve servir aos seus amigos e associados como o Norte:

(i) com presentes,
(ii) com palavras amáveis,
(iii) cuidando do bem estar deles,
(iv) sendo imparcial,
(v) pela sinceridade

"De cinco formas, os seus amigos e associados sendo assim servidos como o Norte pelo membro de um clã, irão retribuir:

(i) eles o protegem quando ele está negligente,
(ii) eles protegem o seu patrimônio quando ele está negligente,
(iii) eles se tornam um refúgio quando ele está em perigo,
(iv) eles não o abandonam nos seus problemas,
(v) eles mostram consideração pela sua família.

“Dessa forma o Norte está coberto, fazendo com que esteja em paz e livre do temor.

"De cinco formas um senhor deve cuidar dos seus serviçais e empregados como o Nadir:

(i) dando-lhes trabalho de acordo com as suas habilidades,
(ii) dando-lhes comida e pagamento,
(iii) cuidando deles na doença,
(iv) compartilhando iguarias com eles,
(v) dando-lhes folga periodicamente.

"De cinco formas, os seus serviçais e empregados sendo assim servidos como o Nadir por um senhor, irão retribuir:

(i) eles se levantam antes dele,
(ii) eles vão dormir depois dele,
(iii) eles somente tomam o que lhes é dado,
(iv) eles realizam bem as suas tarefas,
(v) eles preservam o seu bom nome e reputação.

“Dessa forma o Nadir está coberto, fazendo com que esteja em paz e livre do temor.

"De cinco formas um chefe de família deve servir os contemplativos e brâmanes como o Zênite:

(i) com amor bondade através das ações,
(ii) com amor bondade através das palavras,
(iii) com amor bondade através dos pensamentos,
(iv) por manter a sua casa aberta para eles,
(v) satisfazendo as suas necessidades materiais.

"Os contemplativos e brâmanes sendo assim servidos como o Zênite por um chefe de família, irão retribuir:

(i) eles o refreiam de fazer o mal,
(ii) eles o encorajam a fazer o bem,
(iii) eles o amam com um coração benevolente,
(iv) eles lhe ensinam aquilo que ele ainda não ouviu,
(v) eles esclarecem o que ele já ouviu,
(vi) eles indicam o caminho para os paraísos.

“Dessa forma o Zênite está coberto, fazendo com que esteja em paz e livre do temor." Assim falou o Abençoado. E tendo dito isso, o Mestre disse ainda mais:

"A mãe e o pai são o Leste,
Os Mestres são o Sul,
Esposa e filhos são o Oeste,
Os amigos e associados são o Norte.

Serviçais e empregados são o Nadir,
Os contemplativos e brâmanes são o Zênite;
Quem está preparado para conduzir a vida em família,
Essas seis direções deve venerar.

Quem é sábio e virtuoso,
Gentil e inteligente,
Humilde e livre do orgulho,
Alguém assim será honrado.

Quem é energético e não é indolente,
No infortúnio inabalável,
Sem falhas na conduta, sagaz,
Alguém assim será honrado.

Quem é hospitaleiro e amistoso,
Acolhedor, um anfitrião sem avareza,
Um guia, um instrutor, um amigo,
Alguém assim será honrado.

Generosidade, linguagem doce,
Auxiliar os outros,
Imparcialidade com todos,
Conforme for o caso.

Essas cosias fazem com que o mundo gire,
Como o eixo da roda em um veículo em movimento.
Se isso não existisse no mundo,
Nem a mãe nem o pai receberiam
Respeito e honra dos seus filhos.

Mas como essas qualidades são mantidas
Em grande apreço pelos sábios,
Elas recebem proeminência,
E com razão são louvadas por todos."

Quando o Abençoado disse isso, Sigala, o jovem chefe de família, disse o seguinte: "Magnífico, Mestre Gotama! Magnífico, Mestre Gotama! Mestre Gotama esclareceu o Dhamma de várias formas, como se tivesse colocado em pé o que estava de cabeça para baixo, revelasse o que estava escondido, mostrasse o caminho para alguém que estivesse perdido ou segurasse uma lâmpada no escuro para aqueles que possuem visão pudessem ver as formas. Eu busco refúgio no Mestre Gotama, no Dhamma e na Sangha dos bhikkhus. Que o Mestre Gotama me aceite como discípulo leigo que nele buscou refúgio para o resto da vida."



 

Notas

1. kamma-kilesa, literalmente, 'ações contaminadas.'

2. Essas são as quatro agati, 'atitudes ruins e prejudiciais': chanda, dosa, moha, bhaya.

3. Crimes cometidos por outros dos quais ele é acusado.

4. Um tipo de divertimento.

5. O original em Pali tem "seis causas" já que duas palavras compostas e uma frase com vocábulo duplo são consideradas como unidades.

6. Dhammapada v. 49: "Como uma abelha, sem danificar a flor, sua cor ou perfume, voa para outro lugar, colhendo somente o mel..."

7. Esta porção inclui o que é gasto com boas ações: presentes para bhikkhus, caridade, etc.

8. "O simbolismo é escolhido de propósito: como o dia no Leste, a vida começa com o cuidado da mãe e do pai; a remuneração de professores e o Sul são a mesma palavra: dakkhina; afazeres domésticos seguem quando o jovem se torna um homem, como o Oeste detém a luz do fim do dia; Norte está ‘além’ (uttara), dessa forma através da ajuda de amigos,etc., ele supera os problemas." - (Rhys Davids)

9. Esse é um hábito sagrado dos Aryas que nunca esquecem os mortos. Esta tradição ainda é fielmente observada pelos Budistas do Sri Lanka que fazem cerimonias com oferendas de alimentos para os bhikkhus no oitavo dia, no terceiro mês, e em cada aniversário de morte dos pais. O mérito dessas boas ações é oferecido àqueles que partiram após cada cerimonia. Alem disso a cada punna-kamma (boa ação), um Budista nunca deixa de pensar nos seus pais e oferecer o mérito. Essa é a lealdade e a gratidão mostrada aos pais tal como recomendado pelo Buda.

10. literalmente, 'o povo em volta' (parijana).