quarta-feira, 13 de março de 2013

O Perigo do Desejo Egoísta



O Budismo não combate o desejo como se costuma pensar, numa primeira visão superficial. Ele diagnostica a causa do sofrimento como sendo o desejo; essa é uma das quatro nobres verdades. Mas não é qualquer desejo nem qualquer tipo de desejo; é preciso saber que espécie de desejo seria essa. E além disso, o caminho para libertar-se do sofimento se dá através do nobre caminho óctuplo, não da simples oposição ao desejo. O caminho óctuplo é o que leva à cessação do sofimento, da ignorância, das impurezas; é o que leva à iluminação.

Não é todo e qualquer desejo que é considerado como prejudicial. Um grande exemplo disso é a definição budista de amor: “amor é o desejo de que o outro seja feliz”. O amor é um desejo que é requerido, que não é prejudicial. Já o desejo que causa o sofrimento é outro tipo específico de desejo. No cânone pali essa palavra normalmente traduzida simplesmente como desejo é tanha
(literalmente significa sede, mas uma tradução mais apropriada que pode ser vista em muitos textos que é ânsia,; também aperecem “desejo sedento”, “desejo insaciável”, etc. Se refere, desse modo, especificamente à ansiedade sedenta, ao desejo egoísta, à paixão cega, etc. Tem como sinônimos lobha (cobiça; paixão) e raga (também traduzido como cobiça ou paixão). É uma das três raízes (mula) de estados prejudiciais na mente.


Espero que o texto a seguir seja o primeiro de uma série que poderá ajudar um pouco na indispensável compreensão desse tipo de desejo, como ele é prejucial, sua origem, seu fim e o modo adequado de se comportar em relação a ele afim de atingir o objetivo supremo.

O Perigo do Desejo Egoísta



por Ven. Dr. K. Sri Dhammananda



O desejo sedento é um fogo que queima em todos os seres: toda atividade é motivada pelo desejo. Isso abrange desde o simples desejo físico dos animais aos desejos complexos e frequentemente estimulados artificialmente do homem civilizado. Para satisfazer o desejo, os animais caçam uns aos outros, e os seres humanos brigam, matam, enganam, mentem e realizam várias formas de ações insalubres. O desejo sedento é uma poderosa força mental presente em todas as formas de vida, e é a principal causa dos males da vida. É essa ânsia sedenta que leva aos nascimentos repetidos no ciclo da existência.

Uma vez que tenhamos percebido a causa do sofrimento, estamos numa posição de colocar um fim nele. Assim, como colocar um fim no sofrimento? Eliminando-o na raíz pela remoção do desejo sedento presente na mente. Essa é a Terceira Nobre Verdade. Esse estado onde o desejo sedento cessa é conhecido como Nibbana (nirvana). A palavra Nirvana é composta de ‘ni’ e ‘vana’, significando o sair do desejo sedento ou o fim da ânsia. Esse é um estado que é livre do sofrimento e da roda dos nascimentos. Esse é um estado que não está sujeito às leis do nascimento, decadência e morte. Esse estado é tão sublime que nenhuma linguagem humana pode expressá-lo. Nibbana é Não Nascido, Não Originado, Não Criado, Não Formado. Se não houvesse um Não Nascido, um Não Originado, um Não Criado, um Não Formado, então o escape do mundo condicionado não seria possível.

Nibbana está além da lógica e da razão. Podemos nos engajar em grandes discussões especulativas sobre o Nibbana ou sobre a realidade última, mas esse não é o modo como realmente entendê-lo. Para compreender e realizar a verdade do Nibbana é necessário que trilhemos o Caminho Óctuplo e nos treinemos e purifiquemos com diligência e paciência. Por meio do desenvolvimento espiritual e da maturidade, seremos capazes de realizar a Terceira Nobre Verdade. Mas primeiro devemos começar com saddha, a confiança ou fé de que o Buddha é verdadeiramente competente para nos dirigir no caminho.

O Nobre Caminho Óctuplo é a Quarta Nobre Verdade, a qual leva ao Nibbana. É um modo de vida consistindo de oito fatores. Trilhando esse Caminho nos será possível ver um fim para o sofrimento. Porque o Buddhismo é um ensinamento lógico e consistente que abarca todos os aspectos da vida, esse nobre Caminho também serve como o mais refinado código possível para levar uma vida feliz. Sua prática traz benefícios a nós mesmos e aos outros, e não é um Caminho para ser praticado apenas por aqueles que se chamam buddhistas, mas por toda pessoa inteligente, independente de suas crenças religiosas.